(In)Validade da citação feita por whatsapp no processo penal
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(In)Validade da citação feita por whatsapp no processo penal

Atualizado: 6 de jul. de 2021

Diante dos avanços tecnológicos e da pandemia que ainda estamos vivendo, nos são apresentadas diariamente uma série de novidades, uma delas é a citação e intimação pelo WhatsApp.


Nesse post vamos abordar se a citação feita pelo WhatsApp ou outros aplicativos de mensagem tem validade legal.

 
nulidade citação por whatsapp no processo penal

Diante dos avanços tecnológicos e da pandemia que ainda estamos vivendo, nos são apresentadas diariamente uma série de novidades, uma delas é a citação e intimação pelo WhatsApp.


O Poder Judiciário, por exemplo, está diante de um grande dilema: saúde dos seus funcionários X andamento dos processos.


Como tudo que está sendo afetado pela pandemia, esse confronto é diário, pois de um lado precisamos preservar a segurança dos Magistrados, Membros do Ministério Público, serventuários e até dos Advogados, segundo as justificativas.


De outro lado, temos os processos em andamentos, várias situações, algumas até de vida ou morte, que dependem de uma manifestação do Poder Judiciário.


Diante disso, cada vez mais comum são pessoas se dirigirem aos nossos escritórios informando terem sito citadas ou intimadas via whatsapp ou outros aplicativos de mensagens.


Contudo, a pergunta desses clientes e Advogados é certeira: A citação ou intimação por whatsapp é válida?


Passaremos na sequencia a tecer algumas observações sobre o tema.


OFICIAL DE JUSTIÇA E A FÉ PÚBLICA


O Oficial de Justiça é auxiliar do órgão jurisdicional, cumprindo as determinações deste último fora da sua sede (MARINONI, ARENHART E MITIDIERO, 2015, p. 225).


É a pessoa que está na rua, cumprindo as determinações do Magistrado, efetuando penhoras, avaliações, busca e apreensão e, em muitos casos, citando ou intimado as pessoas sobre a existência de processos criminais ou cíveis ou para comparecem aos mais variados atos, a exemplo das audiências.


Os Oficiais de Justiça possuem a chamada fé pública, ou seja, todos as informações por eles prestadas nos processos, gozam de presunção de veracidade, sendo que a invalidade desses atos depende de prova em contrário.


Logo, todas as suas certidões são consideradas verdadeiras, sendo que a sua invalidade deverá ser provada pela parte interessada.


DA (IN)VALIDADE DA CITAÇÃO/INTIMAÇÃO FEITA POR APLICATIVO DE MENSASGEM


A citação é um dos atos mais importantes no Processo Penal Brasileiro.


Com ela o cidadão passa oficialmente a ter conhecimento que está sendo processado, iniciando as medidas defensivas para comprovar a sua inocência, como contratar um advogado criminalista de sua confiança, procurar provas, bem como, ser cientificado acerca dos limites da acusação que pesa contra ele, entre outras.


Desta forma, a efetividade da citação é primordial, até porque, estamos diante de um do mais importante direito de uma pessoa, que é a sua liberdade.


A pessoa que está sendo processada em ação penal é sujeita de direitos, não podendo ser vista como objeto do processo penal, devendo ter suas garantias sempre preservadas.


Portanto, consideramos (principalmente em tempos de pandemia) que a citação nos processos penais poderá ser feita por via dos aplicativos de mensagens.


Como dito anteriormente, o Oficial de Justiça goza de presunção de veracidade nas suas palavras, não podendo crer que ele venha por má-fé ou preguiça prejudicar qualquer cidadão.


Assim, o Oficial tomando algumas cautelas poderá efetivar a citação por whatsapp, vindo esta a produzir os seus efeitos no processo penal.


Em recente caso o Superior Tribunal de Justiça (HC 641.877, Rel. Mim. Ribeiro Dantas) lançou bases para que esse tipo de citação tenha a validade jurídica necessária, sendo eles: 1) confirmação do número de telefone; 2) confirmação escrita; e, 3) foto individual.


Assim, ao ser procedida a citação/intimação, o Oficial de Justiça deverá inicialmente confirmar o número telefônico da pessoa.


Esse primeiro requisito demonstra-se de certa forma fácil de se verificar, pois, com o número do CPF ou nome completo, é possível que o oficial acesse os números telefônicos cadastrados em nome do cidadão, isso em sistema próprio que o Poder Judiciário tem acesso.


Feito o contato inicial, o Oficial de Justiça deverá ter uma confirmação escrita da pessoa citada, podendo esta mandar uma foto de algum documento pessoal seu ou poderá solicitar uma foto da sua assinatura, desde que o Oficial tenha um padrão para conferir a similaridade das assinaturas.


Por fim, no aplicativo da pessoa a ser citada, deverá o constar a sua foto pessoal.


Em que pese a fé pública dos Oficiais como destacado acima, esta não é suficiente para validar uma citação ou intimação por aplicativo de mensagem, sem que seja garantido os três requisitos estabelecidos.


Como dito, os atos lavrados pelo Oficial de Justiça tem presunção de validade, ou seja, a pessoa citada poderá comprovar no processo que o telefone utilizado para o ato não era mais seu (foi vendido, por exemplo), foi perdido ou furtado, o que que poderá invalidar o ato.


No nosso entender, essas citações por aplicativos de mensagens, tomadas as devidas cautelas, tem excepcional validade diante da pandemia que se apresenta.


Contudo, ela não pode virar uma regra absoluta no Poder Judiciário, até porque, a citação, salvo melhor análise, é ato pessoal e não possui hoje previsão legal para a sua validade ou possibilidade pelos aplicativos de mensagens.


No Processo Penal, ao contrário do Processo Civil, não estamos diante de um BEM da vida (bem móvel, imóvel, dinheiro, etc.), mas, diante da própria vida das pessoas que estão sendo processadas (liberdade).


Necessária é a cautela ao proceder tão importante ato processual que é a citação.


Nos dizeres do Ministro Ribeiro Dantas no Citado HC: "Não se pode prescindir, de maneira alguma, da autêntica, regular e comprovada citação do acusado, sob pena de se infringir a regra mais básica do processo penal, qual seja a da observância ao princípio do contraditório".

 

ÍNTEGRA DO ACÓRDÃO DO HABEAS CORPUS HC 641.877, Rel. Mim. Ribeiro Dantas:

PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO. INADEQUAÇÃO. CITAÇÃO VIA WHATSAPP. NULIDADE. PRINCÍPIO DA NECESSIDADE. INADEQUAÇÃO FORMAL E MATERIAL. PAS DE NULlITÉ SANS GRIEF. AFERIÇÃO DA AUTENTICIDADE. CAUTELAS NECESSÁRIAS. NÃO VERIFICAÇÃO NO CASO CONCRETO. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. [...] 2. A citação do acusado revela-se um dos atos mais importantes do processo. É por meio dela que o indivíduo toma conhecimento dos fatos que o Estado, por meio do jus puniendi lhe direciona e, assim, passa a poder demonstrar os seus contra-argumentos à versão acusatória (contraditório, ampla defesa e devido processo legal). 3. No Processo Penal, diversamente do que ocorre na seara Processual Civil, não se pode prescindir do processo para se concretizar o direito substantivo. É o processo que legitima a pena. 4. Assim, em um primeiro momento, vários óbices impediriam a citação via Whatsapp, seja de ordem formal, haja vista a competência privativa da União para legislar sobre processo (art. 22, I, da CF), ou de ordem material, em razão da ausência de previsão legal e possível malferimento de princípios caros como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa. 5. De todo modo, imperioso lembrar que "sem ofensa ao sentido teleológico da norma não haverá prejuízo e, por isso, o reconhecimento da nulidade nessa hipótese constituiria consagração de um formalismo exagerado e inútil" (GRINOVER, Ada Pellegrini; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; FERNANDES, Antonio Scarance. As nulidades no processo penal. 11. ed. São Paulo: RT, 2011, p. 27). Aqui se verifica, portanto, a ausência de nulidade sem demonstração de prejuízo ou, em outros termos, princípio pas nullité sans grief. 6. Abstratamente, é possível imaginar-se a utilização do Whatsapp para fins de citação na esfera penal, com base no princípio pas nullité sans grief. De todo modo, para tanto, imperiosa a adoção de todos os cuidados possíveis para se comprovar a autenticidade não apenas do número telefônico com que o oficial de justiça realiza a conversa, mas também a identidade do destinatário das mensagens. 7. Como cediço, a tecnologia em questão permite a troca de arquivos de texto e de imagens, o que possibilita ao oficial de justiça, com quase igual precisão da verificação pessoal, aferir a autenticidade da conversa. É possível imaginar-se, por exemplo, a exigência pelo agente público do envio de foto do documento de identificação do acusado, de um termo de ciência do ato citatório assinado de próprio punho, quando o oficial possuir algum documento do citando para poder comparar as assinaturas, ou qualquer outra medida que torne inconteste tratar-se de conversa travada com o verdadeiro denunciado. De outro lado, a mera confirmação escrita da identidade pelo citando não nos parece suficiente. 8. Necessário distinguir, porém, essa situação daquela em que, além da escrita pelo citando, há no aplicativo foto individual dele. Nesse caso, ante a mitigação dos riscos, diante da concorrência de três elementos indutivos da autenticidade do destinatário, número de telefone, confirmação escrita e foto individual, entendo possível presumir-se que a citação se deu de maneira válida, ressalvado o direito do citando de, posteriormente, comprovar eventual nulidade, seja com registro de ocorrência de furto, roubo ou perda do celular na época da citação, com contrato de permuta, com testemunhas ou qualquer outro meio válido que autorize concluir de forma assertiva não ter havido citação válida. 9. Habeas corpus não conhecido, mas ordem concedida de ofício para anular a citação via Whatsapp, porque sem nenhum comprovante quanto à autenticidade da identidade do citando, ressaltando, porém, a possibilidade de o comparecimento do acusado suprir o vício, bem como a possibilidade de se usar a referida tecnologia, desde que, com a adoção de medidas suficientes para atestar a identidade do indivíduo com quem se travou a conversa.
 

Cabe esclarecer que no caso da citação e intimação feita sem a observância dos citados requisitos, mas, a pessoa processada compareça ao processo, esta citação não considerar-se-á nula, ante o Princípio do pas nullité sans grief, ou seja, não há nulidade sem efetivo prejuízo.


Tal princípio vem insculpido no Art. 563. do Código de Processo Penal da seguinte forma: "Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa".



 
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Assim, entendemos ser válida a citação e intimação por meio dos aplicativos de mensagens, isso de forma excepcional, desde que garantida pelo oficial de justiça os três pilares estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça.


Passada a situação excepcional, as citações e intimações deverão, no nosso entender, retomarem a sua normalidade, pois não podemos mitigar, inclusive ao silêncio da lei, importantes Garantias Constitucionais como o efetivo contraditório e ampla defesa.


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LUIZ RICARDO FLÔRES é Advogado Criminalista, formado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI); inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Santa Catarina - sob o n. 23.544; Pós-Graduado pela Universidade Cândido Mendes em Direito Penal e Processo Penal. Atua prestando serviços de assessoria e consultoria jurídica a pessoas físicas e jurídicas em Direito Penal e Processo Penal.

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