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REGRAS DO SISTEMA RECURSAL PENAL

Atualizado: 23 de ago. de 2023

Neste artigo vamos abordar as chamadas REGRAS DO SISTEMA RECURSAL, sendo normas implícitas ou explícitas que norteiam todos os recursos criminais, como recurso em sentido estrito, apelação criminal, enfim, todos os recursos previstos no Código de Processo Penal.

 
regras dos recursos no processo penal

FUNGIBILIDADE NOS RECURSOS CRIMINAIS


A regra da FUNGIBILIDADE garante que um recurso (errado) seja conhecido, processado e julgado como se fosse o correto.


A parte ao invés de interpor um recurso em sentido estrito, o fez como sendo uma apelação, por exemplo.


A regra da fungibilidade está prevista de forma expressa nos termos do art. 579, do CPP:


Art. 579. Salvo a hipótese de má-fé, a parte não será prejudicada pela interposição de um recurso por outro.
Parágrafo único. Se o juiz, desde logo, reconhecer a impropriedade do recurso interposto pela parte, mandará processá-lo de acordo com o rito do recurso cabível.

Como visto na letra da lei, essa regra não se aplica caso seja observado que a parte agiu de má-fé.


Ao tratar do tema má-fé, Lopes Junior doutrina:


“O conceito de má-fé é aberto, indeterminado, permitindo ampla manipulação conceitual. Tampouco soluciona o problema invocar o “erro grosseiro” para caracterizar a má-fé, ou mesmo o “pacífico entendimento jurisprudencial” sobre o cabimento de determinado recurso, mas, em geral, é com base nesses dois fatores (erro grosseiro e ausência de divergência jurisprudencial) que os tribunais pautam a aplicação da fungibilidade”.

Vale destacar que para a fungibilidade ser aplicada, o recurso “errado” deve ser interposto no prazo correto, o que é mais comum nos casos de apelação e o recurso em sentido estrito, por exemplo, já que tem o mesmo prazo para interposição.


Impossível a aplicação dessa regra, por exemplo, no caso da parte ao invés de interpor uma apelação (prazo de 5 dias), apresentar um Recurso Especial (prazo de 15 dias) no décimo dia de prazo.


Nesse caso não há fungibilidade que salva este recurso, ele será considerado intempestivo.


UNIRRECORRIBILIDADE NOS RECURSOS PENAIS


A unirrecorribilidade, como o próprio nome deixa transparecer, assegura que contra uma decisão caberá somente um recurso.


Podemos observar essa regra de forma expressa no art. 593, § 4º do CPP:


§ 4o Quando cabível a apelação, não poderá ser usado o recurso em sentido estrito, ainda que somente de parte da decisão se recorra.

Com a letra da Lei citada, resta evidente que a apelação absorve o recurso em sentido estrito, mesmo que se ataque somente parte da sentença que também poderia ser atacada via recurso em sentido estrito.


Nesses casos a apelação é rainha.


Contudo, como tudo no direito tem as suas exceções, essa regra também tem a sua no caso de decisão que viole tanto a lei federal, quanto a Constituição.


Nesse caso, tendo em vista a matéria a ser discutida, deve ser interposto ambos os recursos (extraordinário e especial), sendo que o recurso extraordinário ficará sobrestada a sua análise aguardando a decisão do recurso especial.


MOTIVAÇÃO DOS RECURSOS CRIMINAIS


Essa regra assegura que em benefício do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, os recursos devem estar acompanhados das suas competentes razões de fato e de direito.


Mesmo nos casos da apelação, onde o CPP assegura que ela pode subir para o Tribunal sem razões (art. 601), na prática, tem sido determinado o seu retorno para o primeiro grau, onde a parte poderá constituir novo defensor, o juízo poderá encaminhar os autos para a defensoria pública ou nomear defensor dativo para tanto.


PROIBIÇÃO DA REFORMATIO IN PEJUS E PERMISSÃO DA REFORMATIO IN MELIUS


Essas duas regras são balizadores do sistema recursal, sendo muito importantes, principalmente para um país que de forma expressa adotou o sistema processual acusatório (art. 3º-A do CPP).


Com essas regras, fica assegurado que uma decisão pode ser reformada sempre para melhorar a situação jurídica do réu, mesmo que a defesa não tenha especificamente recorrido contra ela.


Por exemplo, a defesa recorreu pedindo a absolvição do acusado por ausência de provas somente.


Assim, o tribunal poderá negar provimento desse recurso, mas, reconhecer de ofício a correção da pena aplicada, mesmo que a parte não tenha requerido isso de forma expressa.


Também poderá reconhecer nulidades processuais mesmo que a parte não tenha requerido no seu recurso, entre outras situações.


Por outro lado, caso não haja recurso da acusação, o tribunal não poderá de ofício reconhecer situação prejudicial para o réu.


O art. 617 do CPP de forma expressa prevê essa situação:


Art. 617. O tribunal, câmara ou turma atenderá nas suas decisões ao disposto nos arts. 383, 386 e 387, no que for aplicável, não podendo, porém, ser agravada a pena, quando somente o réu houver apelado da sentença.

A situação é a mesma para os casos dos crimes julgados pelo Tribunal do Júri, sendo que no caso de recurso exclusivo da defesa, caso a sentença de primeiro grau seja cassada pelo tribunal ad quem o novo julgamento deverá ficar limitado à primeira sentença.


Exemplificando:


João é condenado à pena de 6 anos pelo tribunal do júri por homicídio simples. Em recurso, o Tribunal reconheceu uma nulidade e determina que seja feito novo júri. Esse novo júri terá sua pena limitada a 6 anos.


A dúvida surge no seguinte caso:


João foi denunciado e pronunciado por homicídio qualificado, sendo que no primeiro julgamento foi afastada a qualificadora e foi condenado por homicídio simples.


Já no novo júri a defesa não logrou êxito em afastar a qualificadora, nesse caso a pena poderá ser maior que os 6 anos iniciais, já que restou considerada a situação (qualificadora) que não integrava a primeira dosimetria da pena?


A resposta continua sendo a mesma, a nova pena deve ficar limitada à pena inicial de 6 anos, mesmo que agora seja condenado por homicídio qualificado.


Esclarecedor sobre o tema, é o voto do então Ministro Cezar Peluso no HC 89544/RN:


AÇÃO PENAL. Homicídio doloso. Tribunal do Júri. Três julgamentos da mesma causa. Reconhecimento da legítima defesa, com excesso, no segundo julgamento. Condenação do réu à pena de 6 (seis) anos de reclusão, em regime semi-aberto. Interposição de recurso exclusivo da defesa. Provimento para cassar a decisão anterior. Condenação do réu, por homicídio qualificado, à pena de 12 (doze) anos de reclusão, em regime integralmente fechado, no terceiro julgamento. Aplicação de pena mais grave. Inadmissibilidade. Reformatio in pejus indireta. Caracterização. Reconhecimento de outros fatos ou circunstâncias não ventilados no julgamento anterior. Irrelevância. Violação conseqüente do justo processo da lei (due process of law), nas cláusulas do contraditório e da ampla defesa. Proibição compatível com a regra constitucional da soberania relativa dos veredictos. HC concedido para restabelecer a pena menor. Ofensa ao art. 5º, incs. LIV, LV e LVII, da CF. Inteligência dos arts. 617 e 626 do CPP. Anulados o julgamento pelo tribunal do júri e a correspondente sentença condenatória, transitada em julgado para a acusação, não pode o acusado, na renovação do julgamento, vir a ser condenado a pena maior do que a imposta na sentença anulada, ainda que com base em circunstância não ventilada no julgamento anterior. (STF - HC: 89544 RN, Relator: CEZAR PELUSO, Data de Julgamento: 14/04/2009, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-089 DIVULG 14-05-2009 PUBLIC 15-05-2009 EMENT VOL-02360-01 PP-00197).

Cabe destacar que neste caso não há conflito entre o princípio da soberania do júri e da vedação da reformatio in pejus, pois, ambos devem ser lidos como garantia do acusado em processo penal e não como garantia aos jurados. (REBELO, 2009).


Resumindo, quando ocorrer recurso exclusivo da defesa, a nova decisão deverá sempre observar a limitação da pena fixada na primeira decisão.


TANTUM DEVOLUTUM QUANTUM APPELLATUM


Essa regra está vinculada ao efeito devolutivo dos recursos, que de modo geral tanto se devolve quanto se apela.


É uma limitação recursal ao órgão acusador, pois, como visto anteriormente é vedada a reformatio in pejus, contudo, não há limitação ao reformatio in melius.


De forma resumida, o Tribunal ad quem não poderá conhecer de matéria prejudicial ao réu que que tenha sido levantada pela acusação.


Por outro lado, a matéria que beneficia o réu poderá ser levantada de ofício.


Com base nessa regra, mesmo que ocorra a apelação do Ministério Público, a análise do mérito recursal também deverá ser limitada aos argumentos do recurso levantados pela acusação, não podendo o tribunal inovar para prejudicar o réu, somente para beneficiar.


IRRECORRIBILIDADE DOS DESPACHOS DE MERO EXPEDIENTE E DAS DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS SIMPLES NOS PROCESSOS PENAIS


Os despachos de mero expediente são aqueles que têm como única finalidade dar andamento ao processo.


Assim, não estão revestidos de carga decisória, logo, não possuem recursos contra eles.


Por outro lado, as decisões interlocutórias, como regra, não possuem recursos contra elas também, excetuado os casos em que de forma expressa é cabível o recurso em sentido estrito, conforme estudaremos adiante.


Assim, as decisões interlocutórias que de forma expressa não cabe recurso em sentido estrito, como a decisão que recebe a denúncia por exemplo, não precluem, podendo essas questões prejudiciais serem levantadas nas alegações finais ou até como preliminar de apelação.


Também podem ser impugnadas por meio do Habeas Corpus, contudo, devemos lembrar que este não se trata de recurso, mas, de uma ação constitucional autônoma.


Essa regra possui uma exceção, que está situada nos embargos declaratórios, sendo que este poderá ser manejado contra qualquer decisão, uma vez que, é direito da parte compreender a decisão judicial.


COMPLEMENTARIDADE RECURSAL


Essa regra diz respeito à possibilidade da defesa, após apresentar suas razões recursais, apresentar um complemento do seu recurso.


Imagine que a defesa interpõe o seu recurso de apelação e junta suas razões. Ainda no prazo, a Acusação interpôs embargos de declaração com efeito infringente.


Com base nestes embargos, o Magistrado acolhe os embargos e agrava a situação do Acusado, sendo que o prazo para apelação, neste momento, já fluiu por completo.


Desta forma, a defesa não poderá recorrer da nova decisão que agravou ainda mais a situação do Acusado?


Com base neste exemplo que entra a regra da complementaridade recursal, pois, mesmo já esgotado o prazo para a apelação, a defesa poderá complementar as suas razões em função da nova fundamentação.


(IN)DISPONIBILIDADE DOS RECURSOS


Essa regra pode variar de acordo com a especificidade de cada caso.


Inicialmente, nas ações penais de iniciativa privada, a disponibilidade do recurso é livre, podendo o querelante desistir do recurso a qualquer momento.


Por outro lado, o Ministério Público não poderá desistir do recurso interposto, conforme a regra prevista no art. 576, do CPP:


Art. 576. O Ministério Público não poderá desistir de recurso que haja interposto.

Ao Ministério Público é dada a possibilidade de recorrer ou não, mas, uma vez interposto o recurso, ele se tornará indisponível, devendo seguir o seu rito normal.


Já o acusado, somente poderá desistir do recurso caso essa desistência seja um ato consensual dele e de seu defensor.


Caso a desistência seja de apenas um deles, em benefício do Princípio da Ampla Defesa, o recurso deverá seguir o seu caminho.


Nesse diapasão é a súmula 705 do STF:


A renúncia do réu ao direito de apelação, manifestada sem a assistência do defensor, não impede o conhecimento da apelação por este interposta.

Finalmente, caso o defensor constituído desista do recurso, indispensável é a intimação pessoal do acusado para que constitua novo defensor. Caso não manifeste-se pelo interesse em recorrer, ou constitua novo defensor, homologa-se a desistência.


Nesta linha é a súmula 708 do STF:


É nulo o julgamento da apelação se, após a manifestação nos autos da renúncia do único defensor, o réu não foi previamente intimado para constituir outro.

Assim, fica evidente que o recurso é disponível nos casos de ação penal privada ou quando haja concordância do acusado e seu defensor pela desistência. Já o Ministério Público, uma vez interposto o recurso, não poderá desistir do mesmo.

EXTENSÃO SUBJETIVA DOS EFEITOS DO RECURSO


Essa regra está de forma expressa prevista no art. 580 do CPP:


Art. 580. No caso de concurso de agentes (Código Penal, art. 25), a decisão do recurso interposto por um dos réus, se fundado em motivos que não sejam de caráter exclusivamente pessoal, aproveitará aos outros.

Essa regra faz todo sentido, pois, caso um dos acusados recorra tendo como principal fundamento, por exemplo, a atipicidade da conduta, caso seja provido pelo Tribunal esse recurso a decisão aproveitará a todos, já que o fato de um dos acusados não ter apresentado o recurso, não fará a conduta se tornar típica contra ele.


Por óbvio, essa regra não se aplica às condições pessoais, uma vez que essas condições são particulares de cada acusado, não podendo ser aproveitada pelos demais, aos menos que sejam condições como, ser funcionário público.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Assim, como visto as regras dos recursos em matéria criminal são normas gerais que se aplicam a todos os recursos penais, norteando o sistema recursal de modo geral, devendo as partes envolvidas na ação penal ficarem atentas a estas normas.


 
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LUIZ RICARDO FLÔRES é Advogado Criminalista, formado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI); inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Santa Catarina - sob o n. 23.544; Pós-Graduado pela Universidade Cândido Mendes em Direito Penal e Processo Penal. Atua prestando serviços de assessoria e consultoria jurídica a pessoas físicas e jurídicas em Direito Penal e Processo Penal.

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