Com a edição de Lei 13.964/19 (também conhecido como pacote anticrime), passou a vigorar no crime de estelionato (art. 171, do Código Penal), nova natureza jurídica no tocante a ação penal.
Anteriormente à citada alteração, a ação penal era a pública incondicionada, ou seja, o delegado tomando conhecimento do delito dava andamento ao inquérito independentemente da vontade da vítima em ver o investigado processado ou não.
Da mesma forma, o Ministério Público, tomando conhecimento deste crime, ou recebendo os autos do inquérito policial, dava seguimento na ação penal independentemente da vontade da vítima.
Agora com a nova legislação, a prosseguimento da ação penal tornou-se pública condicionada à representação da vítima, depende da representação da vítima, ou seja, de forma expressa a vítima deverá informar se deseja representar contra o acusado.
A dúvida surgida com o assunto não diz respeito aos crimes cometidos após a vigência do Pacote Anticrime, mas sim, com relação aos processos já iniciados antes da nova legislação.
Essa necessidade da representação deve retroagir ou não? As vítimas devem ser chamadas em juízo para firmarem a sua representação? A representação é condição de prosseguimento da ação penal?
Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal por suas Turmas, já se manifestou no sentido da irretroatividade da lei que instituiu a condição de procedibilidade no delito previsto no art. 171 do CP.
Segundo entendimento lá firmado, nos processos em que a denuncia já fora apresentada, desnecessária é a representação da vítima. Por outro lado, nos processos em que a denúncia ainda não foi apresentada, indispensável é a manifestação da vítima, independentemente se o crime foi cometido antes ou depois da vigência da nova lei.
Ao relatar o Habeas Corpus 187341 / SP, o Ministro Alexandre de Moraes afirma que:
Inaplicável a retroatividade do §5º do artigo 171 do Código Penal, às hipóteses onde o Ministério Público tiver oferecido a denúncia antes da entrada em vigor da Lei 13.964/19; uma vez que, naquele momento a norma processual em vigor definia a ação para o delito de estelionato como pública incondicionada, não exigindo qualquer condição de procedibilidade para a instauração da persecução penal em juízo.
A norma debatida tem dupla característica, apresentando-se como penal/processual, sendo que tanto o STJ como o STF acharam um meio termo para sua aplicação.
De modo geral, a norma penal deve sempre retroagir para beneficiar o réu, (CF art. 5º, XL); já a processual, deve começar a valer com o início da sua vigência, ou seja, não deve retroagir (art. 2º do CPP).
Assim, o STF pacificou a questão determinando que o marco para a retroatividade ou não da norma em análise é o oferecimento ou não da denúncia.
Nos processos que a denúncia já foi oferecida, a norma não deve retroagir, pois a lei que vigia na época não exigia a representação da vítima.
Já a nos casos em que a denúncia ainda não foi apresentada (independentemente da data do cometimento do crime), necessária é a representação da vítima, tendo em vista que a nova lei assim o exige.
No mesmo sentido o STJ ao julgar o HC 610.201/SP, Rel. Min. Ribeiro Dantas, Terceira Seção, por maioria, pacificou o entendimento também nesse Tribunal, determinando que a nova legislação, especialmente o § 5º, do art. 171, do Código Penal, deve retroagir nos processo em que a denúncia ainda não foi oferecida.
Já nos processos em que contamos com denúncia, a citada Lei não deve retroagir, pois, o ato jurídico já se encontra perfeito.
Portanto, tanto o STF quanto o STJ possuem entendimento de que a nova lei deve retroagir , independentemente da data do crime, devendo ser levado em conta, sim, se existe ou não oferecimento da denúncia.
Processos com denúncia oferecida não retroage. Processos com a denúncia não oferecida a nova lei retroage.
Dicionário Jurídico
ESTELIONATO: É a figura típica (crime) previsto no artigo 171 do Código Penal. O Estelionato na sua forma simples tem uma pena de reclusão 1 a 5 anos e multa. Está descrito no Código Penal com a seguinte Redação: Art. 171 - Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa, de quinhentos mil réis a dez contos de réis. Segundo Nucci "a conduta é sempre composta. Obter vantagem indevida induzindo ou mantendo alguém em erro. Significa conseguir um benefício ou um lucro ilícito em razão do engano provocado na vítima" (NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 15. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, p. 926) Esse delito teve uma recente alteração no que diz respeito o tipo de ação penal. Anteriormente previa como ação penal pública. Agora com a entrada em vigor do Pacote Anticrime, a ação penal para os crimes de estelionato passou a ser de ação penal pública condicionada a representação.
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No nosso entendimento, acreditamos que a nova lei deveria retroagir em todos os casos, pois, a nova lei parece mais benéfica para os acusados, e, mesmo tendo caráter processual, nesses casos deve retroagir, beneficiando o Princípio da Intervenção Mínima.
Ora, faz sentindo um processo que apura um crime sem violência ou grave ameaça persistir mesmo a vítima dizendo que não tem interesse que ele continue? A nosso sentir, não.
Para pessoas que buscam a aprovação em concursos ou no Exame da OAB, essa alteração legal, bem como, a posicionamento tanto do STF quanto do STJ demonstram-se fundamentais para uma aprovação, pois, certamente esse assunto será abordado em futuras provas.
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LUIZ RICARDO FLÔRES é Advogado Criminalista, formado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI); inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Santa Catarina - sob o n. 23.544; Pós-Graduado pela Universidade Cândido Mendes em Direito Penal e Processo Penal. Atua prestando serviços de assessoria e consultoria jurídica a pessoas físicas e jurídicas em Direito Penal e Processo Penal.
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