Os elementos informativos colhidos no inquérito servem para condenar?
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Os elementos informativos colhidos no inquérito servem para condenar?

Atualizado: 29 de jun. de 2023

Neste artigo vamos destacar se os elementos informativos (provas) produzidas no inquérito policial são (in)suficientes para condenar uma pessoa.

 

CONSIDERAÇÕES INICIAIS



Os elementos informativos colhidos no inquérito servem para condenar?

Esse é um tema de extrema relevância no processo penal, onde se busca definir se elementos informativos produzidos durante o inquérito policial tem força para amparara a condenação de uma pessoa ou não.


O tema ganha destaque, porque como sabemos, a prova produzida durante o inquérito é feita sem sem a observância do contraditório, já que o inquérito tem a sua característica inquisitiva.


Assim, a autoridade policial busca a prova de forma livre, sem que a defesa possa, muitas vezes acompanhar essa produção, muito menos intervir nela ou apresentar provas para contraditar o que foi produzido.


O Advogado criminalista pode até indicar provas para o delegado, mas, a sua efetiva produção, ficará a critério da autoridade policial, sem que seja reconhecido um futuro cerceamento de defesa.


Para respondermos a resposta inicial (a prova produzida no inquérito serve para condenar?), temos que fazer um estudo mais completo sobre o tema prova, o que passamos a fazer na sequencia.


SISTEMA DE VALORAÇÃO DA PROVA (LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO)


Como já destacamos em outras oportunidades, o direito processual penal brasileiro adotou o sistema de apreciação da prova o do livre convencimento motivada ou persuasão racional, isso no art. 155 do CPP:


Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Aqui, o juiz é livre para tomar a sua decisão, contudo, deverá embasá-la nas provas existentes no processo de forma motivada e fundamental, sendo vedada a condenação amparada somente em provas produzidas na fase policial, uma vez que ausente o contraditório.


Essa é uma regra geral, contudo, como quase tudo no direito, existem suas exceções, vejamos.

 
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PROVA PRÉ-CONSTITUÍDAS E PROVAS CONSTITUENDAS DE FONTES PESSOAIS


PROVAS PRÉ-CONSTITUÍDAS


A regra prevista no art. 155 do CPP, tem a sua primeira exceção no caso das provas pré-constituídas, que são aquelas provas que já existiam antes do início do inquérito policial ou mesmo antes do próprio cometimento do crime.


Podemos citar como exemplo, contratos firmados para comprovar a existência de um negócio jurídico fraudulento; uma declaração falsa firmada; uma nota de dinheiro falsa, entre outros.


Vejamos que muitas dessas provas são documentais.


Essa provas são aceitas no processo, podendo o magistrado usá-las até de forma isolada para uma condenação, isso porque, elas já existiam antes da própria instauração do inquérito.


Obviamente, essas provas estão sujeitas ao contraditório judicial, podendo o acusado impugná-las em juízo de forma livre, observando as regras legais.


PROVAS CONSTITUENDAS DE FONTES PESSOAIS


Já essas provas, são aquelas eminentemente produzidas durante o inquérito, como a prova testemunhal, palavra da vítima e o próprio interrogatório.


Tendo em vista que o seu surgimento/produção dessas provas ocorre pela primeira vez durante o inquérito policial (sem observância do contraditório), o magistrado não pode fundamentar uma condenação exclusivamente nessas provas.


Para fundamentar uma condenação, essas provas devem ser refeitas sob o crivo do contraditório na audiência de instrução e julgamento na ação penal, com a participação do acusado e seu advogado.


Isso por força do que determina o art. 155 do CPP.



AUDIÊNCIA INSTRUÇÃO E JULGAMENTO NA PRÁTICA

CORROBORAÇÃO DAS PROVAS PRODUZIDAS NO INQUÉRITO


A pesar de existir essa necessidade das provas constituendas de fonte pessoais serem refeitas em juízo para condenar uma pessoa, elas podem ser corroboradas por outras provas produzidas em juízo.


Vamos imaginar a seguinte situação:


Caso uma testemunha ouvida da delegacia venha a falecer ou mesmo não seja mais localizada para ser intimada sobre o ato judicial, o magistrado pode usá-la para condenar uma pessoa?


De forma isolada não. Mas, caso as outras provas produzidas em juízo sejam no mesmo sentido do depoimento prestado por testemunha unicamente na fase policial, trazendo um certo grau de confiança, o magistrado poderá usar esse depoimento, isso por corroboração.


Contudo, se existem outras provas, não faz muito sentido o magistrado sequer citar essas provas produzidas exclusivamente na fase policial, devendo sempre privilegiar a prova produzida sob o crivo do contraditório.


EXCEÇÃO À REGRA DO ART. 155 DO CPP


O próprio art. 155 do CPP, apresenta algumas exceções à regra por ele próprio definida, como as provas cautelares, provas irrepetíveis e, finalmente, as provas antecipadas, quando essas produzidas durante o inquérito policial.


PROVAS CAUTELARES


As provas cautelares são aqueles que possuem uma urgência na sua produção sob pena de desaparecerem.


Podemos citar como exemplo as provas periciais (perícia no local do crime, exame de corpo de delito, exame necroscópico, etc.), sendo que nesses casos a demora para a produção do competente laudo pode alterar o resultado final.


Assim, a prova é feita de imediato sem a formalização do contraditório.


Nesses casos, é feito um contraditório postergado, sendo que o advogado de defesa poderá formular quesitos complementares, fazer sua própria perícia e ouvir o perito na audiência de instrução.


PROVAS IRREPETÍVEIS


Já as provas irrepetíveis, são aquelas que não podem ser repetidas por causas imprevisíveis e naturais.


Ou seja, a testemunha chave para a elucidação do fato veio a falecer de forma inesperada, por exemplo, faz a prova ser irrepetível em juízo.


Nesses casos NÃO TEMOS RISCO CONHECIDO E PREVISÍVEL DO PERECIMENTO DA PROVA.


As provas irrepetíveis, tendo em vista as suas características, possuem um valor reduzido.


Caso a testemunha seja pessoa idosa, ou com problemas saúde ou ainda que alguma doença terminal, não há que se fala em provas irrepetíveis, pois, o perecimento da pessoa era algo previsível, não podendo o acusado sofrer as consequências pelo descaso da autoridades.


Nestes casos passamos para a última exceção (provas antecipadas).


PROVAS ANTECIPADAS


A última exceção à regra, fala das provas antecipadas.


Os envolvidos no processo, observando que corre o risco de uma das testemunhas vir a falecer (pessoa idosa ou com doença terminal, por exemplo) antes da audiência de instrução, instaram o processo de produção antecipada de provas, justamente para materializar essa prova.


Nesses casos, TEMOS O RISCO CONHECIDO E PREVISÍVEL DO PERECIMENTO DA PROVA.


Como podemos observar, então, PROVA IRREPETÍVEL E PROVA ANTECIPADA NÃO SE CONFUNDEM.


Esse tipo de prova pode ser feito ainda na fase policial (sem o contraditório imediato), ou na fase judicial.


Caso já exista advogado constituído, é indispensável que este seja intimado para participar do ato!


Resumindo o tema, BADARÓ (2022, p. 483/484) leciona:


[...], as provas cautelares e as provas antecipadas, se produzidas durante o inquérito policial, embora impliquem em restrição ao contraditório, poderão ser valoradas, isoladamente, pelo juiz. Já as provas irrepetíveis, por se tratar de situação de contraditório impossível, têm baixíssimo potencial heurístico, razão pela qual, mesmo diante da exceção da parte final do art. 155, caput, do CPP, não serão suficientes para fundamentar uma condenação penal, sob pena de violar o art. 8.2.f da Convenção Americana de Direitos Humanos.

O advogado criminalista estar ciente destas diferenças para não prejudicar o seu cliente.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Assim, a regra geral prevista no CPP é no sentido de que o magistrado não pode condenar com base em provas produzidas somente na fase policial (provas constituendas de fonte pessoal).


Contudo, como toda regra no direito tem as suas exceções, é possível condenar com base nessa prova, desde que:


  • Sejam pré-constituídas

  • Sejam corroboradas por outras produzidas em juízo;

  • Seja prova cautelar (urgência e risco de perecimento)

  • Seja a prova irrepetível; ou,

  • A prova seja produzida antecipadamente.

 
 

Luiz Ricardo Flôres é advogado criminalista.

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