Neste artigo vou tratar do excesso de prazo no processo penal e qual o meio mais adequado para combater esta demora processual (relaxamento de prisão, liberdade provisória ou Habeas Corpus).
É de senso comum, o que verificamos na prática, que os processos judiciais no Brasil são demorados, podendo arrastarem-se por anos e anos.
Tal discussão ganha relevância nas ações penais, pois, muitas vezes, as pessoas estão presas preventivamente nestes processos, por vários meses e até anos, sem que vejam uma solução rápida para sua situação.
No cotidiano do advogado criminalista, a impetração de habeas corpus com fundamento no excesso de prazo, pode ser fundamento viável para a concessão
da ordem e, consequentemente, derrubar essas ilegalidades.
Pensando nisso, surge a dúvida do que efetivamente seria esse excesso de prazo, se existe na legislação ou jurisprudência um número definido de dias para a situação ser considerada como excesso de prazo ou não.
Além disso, uma vez observado esse excesso, qual seria a melhor forma de combater esta ilegalidade?
Em razão disso, inafastável é a discussão do que vem a ser a duração razoável de um processo, principalmente naqueles casos em que o cidadão encontra-se preso preventivamente.
EXCESSO DE PRAZO
A emenda constitucional 45, adicionou o inciso LXXVIII, no art. 5º, da Constituição Federal, elevando a garantia à razoável duração do processo como direito fundamental, vejamos:
LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
Mas logo levanta-se a questão: qual é esse prazo de forma objetiva?
O fato é que nem nossa legislação, nem a jurisprudência definiram de forma objetiva qual é o prazo razoável para um processo criminal chegar ao seu fim.
A jurisprudência tem definido como máxima para essa situação em processos criminais que seja observado primeiramente a complexidade do processo, número de réus, testemunhas arroladas, crime que necessita de complexa perícia, entre outras particularidades que podem fazer o processo demorar mais ou menos.
Outro ponto a ser observado é o fato do Poder Judiciário está agindo ou não com desídia no andamento do processo. Caso fique observado que um processo sem maior complexidade esteja demorando por culpa do Judiciário, o excesso de prazo deve também ser considerado.
Finalmente, o excesso de prazo não pode ser causado pela defesa, como arrolamento de várias testemunhas por carta rogatória, ou nos casos em que o réu fugiu e em razão disso algum ato processual fica prejudicado, por exemplo.
Abaixo colaciono parte de algumas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal que exemplificam as situações citadas acima:
[...]. II - É justificável eventual dilação no prazo para encerramento da instrução processual quando se trata de ação penal complexa e o excesso de prazo não decorra da inércia ou desídia do Poder Judiciário. Precedentes. III - Habeas corpus conhecido em parte e, nessa extensão, denegada a ordem. (HC 100471, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 02/03/2010, DJe-055 DIVULG 25-03-2010 PUBLIC 26-03-2010 EMENT VOL-02395-03 PP-00807).
[...]. I - Conforme remansosa jurisprudência desta Suprema Corte, a fuga do réu do distrito da culpa justifica o decreto ou a manutenção da prisão preventiva. II - Não se configura o excesso de prazo quando o encerramento da instrução protrai-se no tempo na dependência de cumprimento de carta rogatória requerida pela defesa. III - Ordem denegada. (HC 90967, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, julgado em 18/09/2007, DJe-131 DIVULG 25-10-2007 PUBLIC 26-10-2007 DJ 26-10-2007 PP-00063 EMENT VOL-02295-05 PP-00892).
[...]. I. - Processo anulado pelo Tribunal, por cerceamento de defesa, a partir da instrução criminal, para que o réu seja submetido a exame de dependência toxicológica, ficando mantida a sua prisão. II. - Constitui constrangimento ilegal a manutenção da prisão do réu se o excesso de prazo na conclusão da instrução criminal ocorre não por culpa da defesa. III. - H.C. deferido. (HC 74883, Relator(a): CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado em 18/02/1997, DJ 11-04-1997 PP-12192 EMENT VOL-01864-06 PP-01184).
Devemos ter em mente que mesmo um processo sendo considerado complexo, essa complexidade e o tempo de tramitação, devem estar sempre pautados pela razoabilidade, principalmente naqueles casos em que o acusado está preso.
Desta forma, podemos observar que não existe uma regra clara sobre o tema, devendo o excesso de prazo ser analisado de forma particular em cada caso, sempre pautados pelo princípio da razoabilidade.
HABEAS CORPUS, PEDIDO DE LIBERDADE PROVISÓRIA OU RELAXAMENTO DE PRISÃO
Uma vez observado o excesso de prazo, qual seria o melhor caminho a trilhar para combater essa ilegalidade, um pedido de concessão de liberdade provisória, relaxamento de prisão ou o habeas corpus.
Segundo meu entender, o melhor caminho seria o Habeas Corpus.
Para o pedido de concessão de liberdade provisória, inicialmente partimos do princípio que existe a decretação de uma prisão preventiva, naqueles hipóteses previstas no art. 312 do CPP.
Logo, para a concessão da liberdade provisória, aqueles requisitos da prisão preventiva não devem estar mais presentes, momento em que você deve argumentar com o magistrado que a decretou, essa situação (requisitos da preventiva), aguardando a análise do seu pedido.
Já no caso específico do excesso de prazo, partimos da ideia que estamos diante de uma prisão ilegal ou que se tornou ilegal, pela demora na formação da culpa do acusado.
Com isso, limitamos as possibilidades ao pedido de relaxamento da prisão ou o habeas corpus.
O pedido de relaxamento da prisão por excesso de prazo deve ser encaminhado para o juízo de primeiro grau, contudo, no meu ver, pode ser um pouco de perda de tempo.
Na prática, o magistrado de primeiro grau dificilmente reconhecerá que os processos que estão sob os seus cuidados estão tocados pelo excesso de prazo, na prática, já vi acontecer, mas, uma única vez em 15 anos.
Já o habeas corpus, é impetrado diretamente para o tribunal, sendo que com o pedido liminar, terá uma apreciação bem rápida, e, dependendo das particularidades do caso, pode ter sucesso efetivo.
Na prática, você apresentar um pedido de liberdade provisória ou relaxamento de prisão vai dar no mesmo, o magistrado vai analisar o pedido mesmo se você trocar um pelo outro.
Mas, nomear cada medida judicial de forma correta faz parte da nossa obrigação, bem como, pode refletir psicologicamente de forma positiva na nossa atuação perante aquele juiz, destacando o advogado como, no mínimo, zeloso.
Assim, nos casos que levantei o excesso de prazo, em 95% das vezes já interpusemos diretamente o Habeas Corpus no Tribunal, sendo uma boa estratégia para mim.
ENCERRAMENTO DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL E EXCESSO DE PRAZO
Apesar de particularmente não concordar com este entendimento, bem consolidado na jurisprudência está o entendimento de que com a prolatação de sentença de primeiro grau, superada encontra-se a alegação de excesso de prazo.
Entendo que a ilegalidade da prisão por excesso de prazo ainda permanece mesmo após o proferimento de decisão em primeiro grau, pois contamos no nosso ordenamento com o Princípio da Presunção de Inocência.
Assim, mesmo que com sentença condenatória de primeiro grau, a presunção de inocência, bem como, o direito a um julgamento em prazo razoável permanecem inalterados.
O fato do acusado ser condenado por uma sentença ainda não transitada em julgado, no meu entendimento, não justifica mais uma relativização de tão básico direito, que é o de ser julgado em prazo razoável.
Se o processo já está demorando em primeiro grau, quanto mais vai demorar no segundo grau? Quanto mais tempo uma pessoa presumidamente inocente vai ter que aguardar presa?
Enfim, na minha visão não é somente uma questão de direito, mas, de humanidade.
Com tal entendimento, fomentamos situações esdrúxulas como a do homem que ficou preventivamente preso por 3 anos e depois foi absolvido, sendo negado, inclusive, o direito de receber uma indenização.
Quanto vale 3 anos da sua vida na cadeia? Fica a reflexão.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, resta claro que não existe um tempo definido de forma objetiva para servir de base para a configuração de excesso de prazo, sendo que deve ser observada a particularidade de cada caso, sempre pautado pelo princípio da razoabilidade.
Ainda segundo nossa visão, a melhor forma para combater o excesso de prazo é a utilização do habeas corpus manejado diretamente no tribunal competente, uma vez que, dificilmente o magistrado reconhecerá o excesso de prazo na sua atuação, sendo que a utilização do pedido de relaxamento de prisão pode ser uma “perda de tempo”.
Assista um vídeo sobre o tema:
Para Assistir diretamente no youtube esse é o link: https://youtu.be/Pe4Xt5zzPf0
LUIZ RICARDO FLÔRES é Advogado Criminalista, formado em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI); inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional de Santa Catarina - sob o n. 23.544; Pós-Graduado pela Universidade Cândido Mendes em Direito Penal e Processo Penal. Atua prestando serviços de assessoria e consultoria jurídica a pessoas físicas e jurídicas em Direito Penal e Processo Penal.
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